Barragens no rio Eufrates provocam discórdia entre Turquia, Síria e Iraque

No fundo de um vale estreito, às margens do mítico rio Eufrates, a pequena cidade de Halfeti morre aos poucos. As velhas casas de pedras estão quase todas vazias. Uma agência de correio, alguns cafés onde se grelham as enormes carpas do rio, e uma prisão ainda em atividade são os únicos vestígios de vida. A construção, a jusante, da barragem de Birecik, perturbou o sossego dessa região turca, próxima da fronteira Síria.

Ao longo do Eufrates, a Turquia instalou cinco represas como esta, destinadas à irrigação ou à produção de energia. Duas outras estão em construção. Alguns quilômetros ao sul de Birecik, a de Karkamis foi erguida bem na fronteira com a Síria. Mais ao norte, é a represa Atatürk, obra central do Plano para a Anatólia do Sudeste (GAP), um projeto de 22 barragens disseminadas pelo Tigre e pelo Eufrates e seus afluentes.

Esses reservatórios de água, que regulam artificialmente a vazão de água, são denunciados pelos defensores do meio ambiente, que constituíram, em Istambul, um tribunal simbólico para condenar três projetos de barragens. Mas também pela Síria e pelo Iraque, igualmente atravessados pelos dois grandes rios que se juntam para terminar o curso no Golfo Pérsico. Há mais de 24 anos as águas da antiga Mesopotâmia são objeto de uma batalha diplomática entre a Turquia, que detém as fontes, e os seus vizinhos, que lutam por um estatuto “internacional” para o Tigre e o Eufrates.

Por diversas vezes chegou a pairar sobre a região a sombra de uma guerra da água; nos anos 1970, entre a Síria, que construía suas primeiras represas, e o Iraque. Em 1990, é a Turquia que provoca um incidente ao fechar as comportas do rio durante um mês, para preencher o lago da barragem Atatürk. Mais tarde, Ancara ameaça pressionar a Síria, que até 1999 protegia o líder curdo Abdullah Ocalan.

Em 2008, os três países chegaram a um acordo de abrir um Instituto da Água, na represa Atatürk, onde engenheiros estudariam o fluxo e as necessidades de água na região. Mas, um ano depois da previsão de seu lançamento, o projeto ficou paralisado.


O problema mais urgente é o empobrecimento dos solos, segundo Güven Eken, presidente da Doga Dernegi, uma ONG de Istambul. “As barragens não retêm só a água, mas também os sedimentos naturalmente carregados pelos rios”, ele explica. “As terras agrícolas estão menos férteis e mais salgadas”.

Ainda que a vazão de entrada de água na Síria, fixada em 500 metros cúbicos por segundo pelo protocolo de Damasco de 1987, seja mais ou menos respeitada, o Iraque se mostra preocupado. “O desperdício e a má utilização reduziram o nível de água disponível por habitante”, avisou, em fevereiro, o ministro iraquiano dos Recursos Hídricos, Abdul Latif Rachid.

Com o Iraque sendo reconstruído, o consumo deverá aumentar nos próximos anos, explicam os organizadores do Fórum da Água.